terça-feira, 27 de abril de 2010

O tempo passou e me formei em solidão

Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite.

Ninguém avisava nada, o costume era chegar de pára-quedas mesmo. E os donos da casa recebiam alegres a visita. Aos poucos, os moradores iam se apresentando, um por um.

– Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre.

E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão dos meus irmãos. Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia.

– Mas vamos nos assentar, gente. Que surpresa agradável!

A conversa rolava solta na sala. Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre. Eu e meus irmãos ficávamos assentados todos num mesmo sofá, entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. Retratos na parede, duas imagens de santos numa cantoneira, flores na mesinha de centro... Casa singela e acolhedora. A nossa também era assim.

Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes. Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha – geralmente uma das filhas

– e dizia:

– Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa.

Tratava-se de uma metonímia gastronômica. O café era apenas uma parte: pães, bolo, broas, queijo fresco, manteiga, biscoitos, leite... Tudo sobre a mesa.

Juntava todo mundo e as piadas pipocavam. As gargalhadas também.

Pra quê televisão? Pra quê rua? Pra quê droga? A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança... Era a vida respingando eternidade nos momentos que acabam.... Era a vida transbordando simplicidade, alegria e amizade...

Quando saíamos, os donos da casa ficavam à porta até que virássemos a esquina. Ainda nos acenávamos. E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. Era assim também lá em casa. Recebíamos as visitas com o coração em festa... A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, também ficávamos, a família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos... Até que sumissem no horizonte da noite.

O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão, vídeo, DVD, e-mail... Cada um na sua e ninguém na de ninguém. Não se recebe mais em casa. Agora a gente combina encontros com os amigos fora de casa:

– Vamos marcar uma saída!... – ninguém quer entrar mais.

Assim, as casas vão se transformando em túmulos sem epitáfios, que escondem mortos anônimos e possibilidades enterradas. Cemitério urbano, onde perambulam zumbis e fantasmas mais assustados que assustadores.

Casas trancadas.. Pra quê abrir? O ladrão pode entrar e roubar a lembrança do café, dos pães, do bolo, das broas, do queijo fresco, da manteiga, dos biscoitos, do leite...

Que saudade do compadre e da comadre!
 

Texto de: José Antônio Oliveira de Resende Professor de Prática de Ensino de Língua Portuguesa, do Departamento de Letras, Artes e Cultura, da Universidade Federal de São João del-Rei - MG.  

Obrigado à Sara que me enviou por e-mail

domingo, 25 de abril de 2010

Se os tubarões fossem homens

Atendendo sugestão do meu mano Mateus, li, gostei e repasso para vocês o texto de Bertolt Brecht, “Se os tubarões fossem homens”.


Se os tubarões fossem homens, perguntou ao senhor K. a filha de sua senhoria, eles seriam mais amáveis com os peixinhos? Certamente, disse ele. Se os tubarões fossem homens, construiriam no mar grandes gaiolas para os peixes pequenos, com todo tipo de alimento, tanto animal quanto vegetal. Cuidariam para que as gaiolas tivessem sempre água fresca e tomariam toda espécie de medidas sanitárias.

Se, por exemplo, um peixinho ferisse a barbatana, lhe fariam imediatamente um curativo, para que não morresse antes do tempo. Para que os peixinhos não ficassem melancólicos, haveria grandes festas aquáticas de vez em quando, pois os peixinhos alegres tem melhor sabor do que os tristes. Naturalmente haveria também escolas nas gaiolas. Nessas escolas os peixinhos aprenderiam como nadar para a goela dos tubarões. Precisariam saber geografia, por exemplo, para localizar os grandes tubarões que vagueiam descansadamente pelo mar. O mais importante seria, naturalmente, a formação moral dos peixinhos. Eles seriam informados de que nada existe de mais belo e mais sublime do que um peixinho que se sacrifica contente, e que todos deveriam crer nos tubarões, sobretudo quando dissessem que cuidam de sua felicidade futura. Os peixinhos saberiam que este futuro só estaria assegurado se estudassem docilmente. Acima de tudo, os peixinhos deveriam evitar toda inclinação baixa, materialista, egoísta e marxista, e avisar imediatamente os tubarões, se um deles mostrasse tais tendências. Se os tubarões fossem homens, naturalmente fariam guerras entre si, para conquistar gaiolas e peixinhos estrangeiros. Nessas guerras eles fariam lutar os seus peixinhos, e lhes ensinariam que há uma enorme diferença entre eles e os peixinhos dos outros tubarões. Os peixinhos, iriam proclamar, são notoriamente mudos, mas silenciam em línguas diferentes, e por isso não podem se entender. Cada peixinho que na guerra matasse alguns outros, inimigos, que silenciam em outra língua, seria condecorado com uma pequena medalha de argaço e receberia um título de herói. Se os tubarões fossem homens, naturalmente haveria também arte entre eles. Haveria belos quadros, representando os dentes dos tubarões em cores soberbas, e suas goelas como jardim que se brinca deliciosamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam valorosos peixinhos nadando com entusiasmo para as gargantas dos tubarões, e a música seria tão bela, que seus acordes todos os peixinhos, como orquestra na frente, sonhando, embalados, nos pensamentos mais doces, se precipitariam nas gargantas dos tubarões. Também não faltaria uma religião, se os tubarões fossem homens. Ela ensinaria que a verdadeira vida dos peixinhos começa apenas na barriga dos tubarões. Além disso, se os tubarões fossem homens também acabaria a idéia de que os peixinhos são iguais entre si. Alguns deles se tornariam funcionários e seriam colocados acima dos outros. Aqueles ligeiramente maiores poderiam inclusive comer os menores. Isso seria agradável para os tubarões, pois eles teriam com maior freqüência, bocados maiores para comer. E os peixinhos maiores detentores de cargos, cuidariam da ordem entre os peixinhos, tornando-se professores, oficiais, construtores de gaiolas, etc. Em suma, haveria uma civilização no mar, se os tubarões fossem homens."

Nota: Eugen Berthold Friedrich Brecht nasceu em Augsburg – Alemanha em 10 de Fevereiro de 1898 e morreu em Berlim no dia 14 de Agosto de 1956. Foi um destacado dramaturgo, poeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido a partir das apresentações de sua companhia o Berliner Ensemble realizadas em Paris durante os anos 1954 e 1955. Seu trabalho como artista concentrou-se na crítica artística ao desenvolvimento das relações humanas no sistema capitalista.


Foto: Bertolt Brecht


Fonte: wikipedia

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Fé, futebol e carnaval


Fé, futebol e carnaval... A tríplice paixão utilizada pela classe dominante para martirizar o povo. Enquanto os desmandos acontecem do lado de lá do muro, do lado de cá, o povo decora os dez mandamentos, acredita que sua doutrina seja a correta e busca em Deus o refúgio contra os citados desmandos. Enquanto a massa grita gol e idolatra ídolos forjados por uma imprensa ávida por garotos propagandas que facilitarão a venda de seu produto, do lado de lá do muro, uma minoria marca golaços contra nossa dignidade. Enquanto um povo sem escola ama escolas de samba, não vê que a passarela da vida é repleta de traições. Existe uma minoria se deliciando com as delícias de um país rico... Enquanto esta minoria tem tudo, o povo se contenta em ter fé, futebol e carnaval. Até quando? Se cada brasileiro entendesse de bolsa de valores tanto quanto acredita saber de futebol, este país seria diferente. Está na hora de acordarmos. O verdadeiro jogo já começou e estamos perdendo de goleada...

Marcos Valnei

terça-feira, 13 de abril de 2010

Voltando pessoal

Para todos aqueles que reclamaram minha ausência neste espaço, meu agradecimento. Reconheço que dei uma abandonada no pobrezinho do blog. Mas, é que tava virando compromisso e ele nasceu pra ser prazeroso. Agora que descansei da rotina de atualizar diariamente, voltarei a dedicar parte do meu tempo para as pessoas que me honram com sua visita. Aos seguidores e frequentadores eventuais, o meu carinho e gratidão pela paciência.
Beijos...

Como a Copa do Mundo está se aproximando, decidi trazer algumas curiosidades sobre os mundiais ao longo da história. Para começar, algo sobre a primeira Copa:



Vocês sabem quem marcou o primeiro gol do Brasil em copas do mundo? Foi João Coelho Neto (1905-1979), o Preguinho. Mas a memória de Preguinho, ou Prego, como consta nos registros históricos da primeira edição da copa em 1.930, não é cultuada pelo Brasil como deveria: ele foi o autor do primeiro gol da seleção em copas do mundo. Na estreia, contra a Iugoslávia, o Brasil perdeu por 2 a 1, mas Preguinho deixou o dele.

A Copa do Mundo de 1930 no Uruguai

Depois da Olimpíada de 1928, com divergência quanto à condição de amadores dos jogadores e sabendo que o futebol não faria parte dos Jogos Olímpicos de 1932, a FIFA decidiu realizar sua própria competição internacional de futebol.

A competição foi criada pelo francês Jules Rimet, em 1928, após ter assumido o comando da instituição mais importante do futebol mundial: a FIFA - Federation International Football Association.

O país escolhido para receber a Copa do Mundo 1930 foi o bicampeão olímpico Uruguai, que celebraria também o centenário de sua independência. A longa viagem transatlântica assustou os Europeus, que foram representados por apenas 4 seleções: Bélgica, França, Romênia e Iugoslávia. No total apenas 13 países participaram da Copa do Mundo 1930.

Delegação Brasileira: Araken, Benedicto, Benevenuto, Brilhante, Carvalho Leite, Doca, Fausto, Fernando Giudicelli, Fortes, Hermógenes, Itália, Ivan Mariz, Manoelzinho, Moderato, Nilo, Oscarino, Pamplona, Poly, Preguinho, Russinho, Theóphilo, Velloso, Zé Luiz e Técnico Píndaro de Carvalho Rodrigues.

A seleção Brasil teve uma participação modesta na Copa do Mundo de 1930, foi eliminado na primeira fase com 1 vitória e 1 derrota. A seleção brasileira, desfalcada dos jogadores de clubes paulistas com exceção de Araken do Santos, perdeu na estréia por 2x1 para a Iugoslávia e venceu a Bolívia por 4x0.

Campeão da Copa do Mundo 1930

Uruguai